Vida, história e afeto no Segundas Intenções
23 DE julho DE 2024A escritora Juliana Leite esteve na Biblioteca de São Paulo no último sábado, 20 de julho, no programa Segundas Intenções, para um bate-papo sobre vida e carreira, com o jornalista Manuel da Costa Pinto.
Na conversa, Juliana trouxe um pouco do seu passado, dos seus antepassados e, ainda, de suas crises e de como tudo isso a levou para o mundo da literatura.
De certa forma, tudo está conectado. Seus dois romances Entre as Mãos e Humanos exemplares estão repletos de inspiração desencadeada pela história de vida de seus antepassados e o quanto isso impactou seu imaginário ao longo de seu caminho.
Juliana vem de uma família de imigrantes de Minas. Seus avós maternos tiveram dez filhos e viviam num sítio onde produziam quase 100% do que necessitavam. Sua mãe conta que eles compravam somente tecido e açúcar. Todo o resto era feito dentro de casa. “Todos os filhos tinham que ser capazes de produzir tudo ali dentro”, ressalta Juliana.
Mas chega o momento em que sua avó entende que seus filhos precisam ser alfabetizados e, por isso, o casal decide ir para Petrópolis/RJ. A autora conta que fica imaginando seus avós arrumando um caminhão, para colocar dez filhos dentro dele e seguir em uma viagem que eles nunca tinham feito antes. “Essa é a imagem que carrego na minha cabeça: esse caminhão com dez filhos, os farnéis de arroz, feijão, fubá, para segurar as primeiras semanas. E uma grande coragem para enfrentrar o absoluto desconhecido com todas essas crianças e adolescentes”, conta.
A autora também reflete sobre a chegada dos avós em Petrópolis, que já implica na tentativa de colocar esses filhos para trabalhar em mercearias, em pequenos comércios da cidade, a fim de começar a ter uma renda.
Seu avô agricultor, que foi ensinado a cuidar da terra até os 50 anos, chegava na cidade com uma experiência que não tinha serventia. Então, segue em busca de ser porteiro, faxineiro ou qualquer atividade que conseguisse fazer para sobreviver.
Juliana cresceu dentro desse universo de contos, a partir da memória dos parentes relatando como foi a travessia da família para chegar até a cidade, com histórias de quanto durou os farnéis de comida ou de como foi a partilha do leite quando chegaram lá. “Toda essa capacidade de contar história era a visão deles de sustentar as biografias”, explica a autora, que recebia relatos de sua mãe, de tios e até primos mais velhos.
Para ela, essa narrativa de sua origem é muito importante, pois foi o que construiu o seu imaginário literário. Tanto é que as memórias das histórias que ouviu de seus parentes reverberaram em suas obras.
No romance Entre as mãos, por exemplo, está presente o trabalho manual e a ideia da melancolia da narrativa. Também está presente o personagem do velho centenário, que contempla o vazio dos desaparecimentos dos entes queridos, assim como seu avô.
Em Humanos exemplares, essa figura do velho e do ritual de pedir a benção aos mais velhos também está relacionada às suas memórias e, principalmente, às suas experiências com o avô.
“A gente não tem como fugir da gente mesmo”, ressalta Juliana, que acredita não ser possível escapar do processo longo e profundo que nos leva sempre de volta para nós mesmos.
A história de Juliana e sua maneira de contar são fascinantes! Vale muito a pena assistir todo o bate-papo e mergulhar um pouco mais em detalhes sobre seu avô, que no caminho de sua morte, se mostrou como o primeiro escritor da vida de Juliana.
O bate-papo na íntegra em breve poderá ser visto no canal da BSP no YouTube. Acompanhe!